Este texto tem como objetivo apresentar a iniciativa de construção de um padrão para geração de dados abertos abordando aspectos da inovação colaborativa (CROSBY ET AL., 2017; TORFING, 2013) que foram identificados durante seu processo de criação e design.
Ao tratarmos de inovação com foco no setor público, uma característica em comum é facilmente observada: o surgimento a partir da necessidade de resolução de problemas (ANSELL; TORFING, 2014).
Essa iniciativa também surgiu a partir da resolução de um problema. As temáticas de governo aberto, dados abertos e contratação aberta vêm ganhando espaço nos debates e práticas acadêmicas e de gestão pública como instrumento para ampliação da transparência, da accountability e do aprimoramento dos serviços prestados pela administração pública. Entretanto, mesmo diante de um arcabouço legislativo robusto que preconiza os dados abertos, estados e municípios não possuem um padrão mínimo a seguir e se deparam com desafios relativos à integração, interoperabilidade, recursos e viabilidade de atender às expectativas de diferentes agentes em relação aos dados. Este cenário resulta por vezes em iniciativas de abertura de dados isoladas que visam apenas o atendimento aos requisitos legais.
Este é um problema complexo, que envolve variáveis técnicas e políticas, bem como a atuação e influência de diversos atores interessados, como órgãos de controle interno e externo, organizações da sociedade civil, canais de comunicação, entre outros (Schommer et al, 2022). Crosby et al. (2017) argumentam que problemas complexos, devido a uma variedade de restrições, não conseguem ser resolvidos dentro da perspectiva da burocracia e que é preciso utilizar estratégias que contornem e ampliem os compromissos e as rotinas institucionais arraigadas do governo.
Diante desse contexto, professores e pesquisadores da Udesc Esag e a Prefeitura de Blumenau firmaram parceria para construir e propor um padrão replicável de dados abertos estruturados, em colaboração com outras iniciativas de abertura de dados e compras públicas. O método contempla a construção colaborativa da proposta do padrão por meio da constituição de uma rede de padronização.
A proposta do padrão considerou legislações e melhores práticas administrativas e contábeis, e ontologias existentes de dados em compras e contratações públicas, articulando conhecimentos e visões distintas: 1) do ente que deve disponibilizar dados, neste caso as prefeituras; 2) dos órgãos de controle – controladorias municipais, Tribunais de Contas e Ministério Público; 3) e de cidadãos, empresas e sociedade civil organizada, como observatórios sociais e outras organizações.
Crosby et al. (2017) enfatizam a importância de um processo inclusivo de tomada de decisões, no qual múltiplos interessados contribuem com suas perspectivas únicas. Os autores destacam que a diversidade de pontos de vista não apenas enriquece a discussão, mas também aumenta a legitimidade e a aceitação das soluções propostas. Essa abordagem oferece um terreno fértil para a cocriação de soluções criativas.
Nesse caso, a padronização pode representar um ganho que extrapola os municípios com a possibilidade de comparar dados de todos os entes federados, independentemente da unidade federativa que façam parte, a partir da criação de uma Rede de Padronização de Dados Abertos, ampliando os trabalhos realizados na fase de design.
Entende-se que a iniciativa pode ser considerada uma inovação colaborativa, pois reuniu uma diversidade de atores, seus interesses conflitantes foram geridos e promoveu-se o aprendizado mútuo.
REFERÊNCIAS:
ANSELL, Christofer; TORFING, Jacob. Public innovation througt collaboration and design. New York, 2014.
Crosby, B. C. ET AL. (2017) Public value creation through collaborative innovation, Public Management Review, 19:5, 655-669, DOI: 10.1080/14719037.2016.1192165
KINDER, Tony. Innovation in na inter-organizacional contexto. In: OSBORNE, Stephen P.; BROWN, Louise. Handbook of innovation in public services. Cheltenham: Edward Elgar, 2013. Cap. 21.
SCHOMMER, P. C. at al. Abertura de dados abertos em compras e contratações públicas como um processo tecnopolítico e ontológico. Disponível em: https://www.estadao.com.br/politica/gestao-politica-e-sociedade/abertura-de-dados-em-compras-e-contratacoes-publicas-como-um-processo-tecnopolitico-e-ontologico/. Acesso em: 30 de nov 2023.
Possui graduação em Administração Pública pela Universidade do Estado de Santa Catarina (Esag/Udesc). Tem experiência em gestão e articulação de redes, atuando desde 2017 em projetos envolvendo múltiplos atores em parceria com governo, empresas e organizações da sociedade civil. Já atuou na Controladoria Geral do Estado de Santa Catarina (CGE/SC), Câmara Municipal de Florianópolis (CMF) e Instituto Comunitário da Grande Florianópolis (ICOM). Atualmente está Diretora de Gestão Administrativa e Financeira na Prefeitura Municipal de Florianópolis.